A quota de condomínio mais atrasada é a primeira a ser saldada

Nos termos do artigo 1424º do Código Civil “as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações”, sendo assim os Condóminos responsáveis pelo pagamento das quotas de Condomínio aprovadas em Assembleia de Condóminos. 

Em anotação a este artigo refere a Dra. Ana Prata que estamos perante uma “obrigação de contribuir para as despesas necessárias à conservação e à fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum é uma obrigação real (ou propter rem), na medida em que é uma obrigação (isto é, uma relação jurídica obrigacional) que impende sobre o titular de um direito real”. 

Entendimento este acompanhado pela nossa jurisprudência no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24/02/2015 (processo nº 2215/14) ao referir que “o condómino tem a obrigação de comparticipar para as despesas suportadas pelo condomínio na manutenção, conservação e segurança do espaço total em que o condomínio se insere”. 

Ora no caso de um proprietário que não efetue os pagamentos das quotas vencidas numa pluralidade de anos, e que efetue pagamento em prestações ou por conta, deve cada pagamento ser associado à prestação mais antiga,

Na verdade, cumpre esclarecer que as quotas de condomínio prescrevem no prazo de 5 (cinco) anos nos termos do artigo 310º alínea g) do Código Civil. Sendo este também o entendimento da nossa jurisprudência conforme Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21/06/2011 (processo nº 7855/07.6BOER-A.L1-7) ao afirmar que “é de 5 anos o prazo de prescrição da obrigação do condómino pagar as despesas do condomínio”. 

O nosso entendimento é também acompanhado pelos Julgados de Paz de Setúbal (processo nº 156/2014-JP) ao afirmarem que se aceita que “a demandada pudesse especificar os meses cujo pagamento desejava efectuar, por legalmente admissível, mas também se tem como correcto o procedimento do condomínio ao imputar os pagamentos às quotas mais antigas”. 

Fazendo este entendimento todo o sentido, caso contrário, os Condóminos devedores poderiam optar por pagar as quotizações mais recentes e, assim, ver a possibilidade de escapar às suas obrigações mais antigas, vendo as mesmas prescrever. 

Por outro lado, e sendo aceite um plano de pagamentos este problema poderá ser ultrapassado através da assinatura devidamente autenticada de um acordo de pagamento no qual ficarão devidamente especificadas as quotas em dívida salvaguardando assim o Condomínio quanto ao pagamento das quotas mais antigas em dívida. 

Carregamento de veículos elétricos em condomínios

As regras para a instalação do posto de carregamento estão definidas no Decreto-Lei n.º 90/2014, que estabelece o Regime Jurídico da Mobilidade Elétrica. 

De acordo com o n.º 1 do artigo 29.º do referido Regime Jurídico, a instalação de um posto de carregamento de veículos elétricos, por qualquer condómino, arrendatário ou ocupante legal, é perfeitamente admitida, desde que custeada pelo próprio, e cumpra os requisitos técnicos estabelecidos pela Direção Geral de Energia e Geologia. 

No caso de o condómino pretender instalar um posto de carregamento de carros elétricos numa parte comum do edifício ou a instalação do ponto de carregamento passar em local que integre uma parte comum do edifício, deverá informar a administração do condomínio da sua intenção, através de uma comunicação escrita, com a antecedência mínima de 30 dias sobre a data pretendida para fazer a instalação ou a transformação. 

Sendo que, a Administração de Condomínio só poderá opor-se à referida obra, caso se verifiquem uma das seguintes situações: a) Quando, depois de comunicada a intenção de proceder à instalação, o Condomínio decida realizar no prazo de 90 dias, a instalação de um ponto de carregamento que permita assegurar o carregamento de baterias, com o mesmo tipo de tecnologia e as necessidades de todos os potenciais utilizadores; b) Quando no edifício já exista um ponto de carregamento para uso partilhado com os mesmos serviços e a mesma tecnologia; c) Quando a instalação coloque em risco efetivo a segurança de pessoas ou bens ou prejudique a linha arquitetónica do edifício. 

Nos últimos dois casos, isto é, quando o edifício já disponha de um ponto de carregamento ou se a instalação ponha em risco a segurança de pessoas e bens ou prejudique a linha arquitetónica do edifício, a Administração pode opor-se à realização da obra no prazo de 60 dias após a comunicação da intenção da instalação e carece da aprovação por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, nos termos do n.º 4 do artigo 29.º do Regime Jurídico da Mobilidade Elétrica. 

A instalação do posto de carregamento por iniciativa do Condomínio – para uso de todos os condóminos – depende assim da aprovação por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, correndo a realização da obra e as respetivas despesas por conta de todos os condóminos na proporção da sua quota. 

Estacionamento abusivo. Remoção de viaturas

Não raro somos questionados sobre a possibilidade de remoção de viaturas abandonadas em parqueamentos privados de condomínios.

A resposta à questão não é simples uma vez que as regras relativas ao estacionamento indevido ou abusivo só se aplicam aos veículos estacionados durante mais de 30 dias na via pública. Nos termos do artigo 165º do Código da Estrada: “1 – Sempre que um veículo se encontre estacionado abusivamente, a autoridade competente para a fiscalização deve proceder à notificação do respectivo proprietário, para a residência indicada no mesmo veículo, para que o retire do local no prazo máximo de quarenta e oito horas. 2 – No caso de o veículo apresentar sinais exteriores evidentes de impossibilidade de deslocação com segurança pelos seus próprios meios, da notificação deve ainda constar que o veículo não pode estacionar na via pública enquanto não for reparado.3 – Se o veículo não tiver a indicação do nome e residência do proprietário, nos termos legais, é dispensada a notificação”.

Já quanto aos veículos abandonados nas partes comuns dos prédio não existe uma norma específica que discipline, daqui decorrendo riscos para o administrador do condomínio uma vez que a sua atuação pode violar o direito de propriedade do dono do automóvel. A nosso ver, aplicam-se, contudo, as regras das boa fé e do abuso de direito (nos termos do artigo 334.º do Código Civil “É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”). 

Contudo, com base nos princípios destas normas, a nosso ver, bastará a administração ter suficientemente divulgado a sua intenção de os remover o veículo para a via publica dentro de um prazo razoável (por exemplo 30 dias) para que já não seja possível de boa ninguém reclamar a sua propriedade ao condomínio. Deste modo, recomendamos a afixação do prédio de circular anunciando a intenção de rebocar o veículo dentro de 30 dias e dirigir semelhante comunicação à lista de endereços de email.

Caso o condomínio pretenda remover o veículo para um parqueamento municipal o contacto com o município poderá ser útil. Por última, a solução radical de venda de peças/destruição do veículo para cobrir a despesa do reboque é algo a considerar com todo o cuidado, sendo que neste neste caso a cobertura de uma decisão da Assembleia participada e inclusão na ata poderá melhor salvaguardar o condomínio.

Reforçamos que nenhuma desta soluções tem cobertura legal direta pelo que quanto maior for a divulgação e o período de tempo a considerar até à retirada do veículo do parque maior será a salvaguarda para o condomínio.

Terraços de Cobertura. Dever de vigilância.

A natureza jurídica dos terraços de cobertura e a repartição de responsabilidades entre o condomínio e o titular da fração levantam um número crescente de questões quanto a sobre quem impendem os deveres de vigilância.

Primeiramente é pacífico que os terraços de cobertura ,como resulta da  b), do n.º 1, do Artigo 1421.º, do Código Civil, são uma parte comum de uso exclusivo de uma das frações. Isto significa que as obras estruturais a realizar são da responsabilidade do condomínio e aquelas que resultem do desgaste normal ou deficiente manutenção da fração são responsabilidade do proprietário. O princípio é simples: existindo uso exclusivo da fração não responde o condomínio pela manutenção e só o proprietário que detém esse uso exclusivo pode ser responsabilizado. A jurisprudência dos Tribunais é unanime nesta matéria, como pode verificar aqui: http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/d3b05ce92ef9c62b8025847300549fde?OpenDocument.

Dito isto existem algumas zonas de fronteira relacionadas com a drenagem de águas pluviais e a responsabilidade pela sua conservação que ainda suscitam dúvidas. Veja-se o entupimento de tubo de drenagem do terraço afeto a uma fração. Estará em principio em causa a manutenção  – ou a falta dela – por parte do proprietário. Contudo, em muitos circunstâncias, não nos é possível com rigor técnico ou com certeza jurídica absoluta afirmar que o condomínio não possa vir a ser parcialmente responsabilizado em caso de deficiente manutenção das condutas gerais do prédio. Dito de outra forma: a limpeza é em primeira linha da responsabilidade do proprietário da fração que deve manter o terraço impedindo entupimentos. Mas pode também ser do condomínio caso exista omissão do dever de vigilância por parte do condomínio. Isto é caso a conduta de drenagem (que liga o terraço à rua) não tenha igualmente tido manutenção. Neste sentido igualmente existe jurisprudência unanime: https://jurisprudencia.pt/acordao/197084/ Assim, caso se tenha verificado igualmente esta omissão de deveres de cuidado por parte do condomínio (culpa in vigilando) a responsabilidade pode igualmente caber-lhe. A aferição do grau de responsabilidade nestes casos será igualmente técnica (devendo ser quesitada em estudo ealborado por perito) mas,  resulta das regras de experiência comum, que esta responsabilidade do condomínio, a existir, será residual, uma vez que o habitual acesso e a manutenção do espaço lhe estão vedados.

Posso queixar-me de um vizinho ruidoso ao Condomínio?

O ruído é um problema transversal às relações de vizinhança, evidentemente potenciado nas situações de propriedade horizontal. 

Antes de mais, cumpre dizer que o ruído de vizinhança não é um problema do condomínio (embora na maioria das vezes surja no seu âmbito), mas sim das relações entre os condóminos. 

A situação deverá ser tratada diretamente pelos condóminos afetados pelo ruído. 

Posto isto, uma forma de lidar com a situação reportada, e que aconselhamos que seja o primeiro comportamento, é o envio de uma carta, a intimar os senhores proprietários da fração em causa a absterem-se de produzir ruído em níveis prejudiciais para os restantes condóminos, sob pena de não restar qualquer outra opção senão a via judicial. 

Este será o primeiro passo tendo em vista a resolução deste problema. 

No entanto, caso o envio de tal carta se mostre infrutífero, a lei prevê mecanismos judiciais próprios para defender os cidadãos que sejam prejudicados pela emissão de ruído pelos seus vizinhos. 

Desde já, sublinhe-se que os danos causados por este comportamento tornam possível o recurso a uma ação de responsabilidade civil extracontratual, na qual seria peticionada uma indemnização pelos prejuízos causados pela emissão de ruído, principalmente pela violação do direito ao descanso dos vizinhos. 

Porém, existe ainda outra via que, os condóminos afetados, poderão seguir: o recurso às autoridades policiais. 

Com efeito, indica o artigo 24.º do Decreto Lei 9/2007, no seu n.º 1 que “As autoridades policiais podem ordenar ao produtor de ruído de vizinhança, produzido entre as 23 e as 7 horas, a adoção das medidas adequadas para fazer cessar imediatamente a incomodidade” e no n.º 2 que “As autoridades policiais podem fixar ao produtor de ruído de vizinhança produzido entre as 7 e as 23 horas um prazo para fazer cessar a incomodidade”. 

Nesse sentido, caso após o envio da carta o ruído se mantenha sugerimos que, os vizinhos lesados, entrem em contacto com as autoridades competentes para que aos mesmos levantem o auto da ocorrência. 

De modo a aumentar a eficácia da queixa, devem os queixosos aproveitar todas as oportunidades para registar datas, horas e a duração do ruido, assim como para reunir testemunhas: os outros vizinhos; visitas; etc. 

Assim, no seguimento da notificação pelas autoridades policiais, caso os condóminos ruidosos perpetuem o comportamento visado, tal constituirá uma contraordenação ambiental, punível com uma coima de € 500 a €2500 em caso de negligência e de €1500 a € 5000 em caso de dolo. 

13 Breves notas sobre o novo regime da Propriedade Horizontal

Foi aprovado na recentemente na Assembleia da República o novo regime da propriedade horizontal que introduz um conjunto de alterações muito significativas na forma de relacionamento entre condóminos e com a administração. Deixamos aqui nota das principais alterações de acordo com o nosso subjetivo grau de importância, remetendo para estudo mais detalhado de cada uma no futuro mais próximo da entrada em vigor dentro de aproximadamente 3 meses. 

  1. Venda do imóvel e responsabilidade pelas quotas de condomínio. O condomínio que pretenda vender o imóvel necessita solicitar ao Administrador declaração escrita com as dividas ao condomínio. O administrador entrega ao vendedor uma relação das quotas de condomínio em dívida no prazo máximo de 10 dias a contar do pedido formulado. A falta do pedido de declaração implica que o vendedor assume a responsabilidade pelas dívidas. Caso o comprador declare na escritura que prescinde da declaração de dívida assume enquanto novo proprietário a dívida. As quotas extra que se vençam até à data da escritura são da responsabilidade do anterior proprietário e as quotas extra que se vençam após a escritura são da responsabilidade do novo proprietário. 
  1. Prazo para execução de deliberações. O administrador passa a dispor de um prazo máximo de 15 dias uteis para executar as deliberações da Assembleia (salvo casos de impossibilidade devidamente fundamentada). 
  1. Convocação da Assembleia de Condóminos por email. Passa a ser possível convocar a Assembleia de Condóminos por email para os condóminos que o declarem. O mesmo é valido para o envio da ata das deliberações. 
  1. Reunião em 2ª convocatória 30 minutos após no caso de inexistência de quórum. Passa a ser consagrado o entendimento já em vigor na generalidade dos prédios por razões prática abandonando-se o anterior texto da lei que obrigava à repetição uma semana após. 
  1. Realização de Assembleias à distância. Manutenção do regime em vigor durante a pandemia para futuro com a salvaguarda por parte das administrações dos condóminos que não disponham dos meios tecnológicos adequados. 
  1. Prazo para interposição da ação executiva. A ação judicial passa a ser instaurada no prazo máximo de 90 dias a contar do primeiro incumprimento do condómino, salvo deliberação contrária da Assembleia no caso de pequenas dívidas inferiores ao valor do IAS (atualmente 438,81).  
  1. Deveres de informação aos condóminos quanto a processos judiciais. Passa a ser obrigatória para os administradores a informação aos condóminos de qualquer ação movida contra o condomínio e semestralmente do andamento dos processos em curso. 
  1. O administrador do condomínio passa a representar a universalidade dos condóminos em processo judicial. Inclui-se nesta representação as deliberação da Assembleia contrariando o entendimento maioritário dos Tribunais que consideravam até agora ser necessário o chamamento de todos os condóminos. 
  1. Obrigatoriedade de apresentação em Assembleia de 3 orçamentos para a realização de obras. 
  1. Alterações ao titulo constitutivo podem ser supridas judicialmente sempre que a oposição seja inferior a 1/10 do valor do capital investido. Na prática um condómino isolado deixa de poder inviabilizar as alterações ao título podendo o Tribunal vir a decidir pela alteração do titulo quando menos de 1/10 de todos os condóminos a aprove e a alteração não modifique as condições de uso, o valor relativo ou fim a que as frações se destinam. 
  1. A alteração da forma de repartição das quotas passa a ser aprovada por maioria do valor total do prédio sem oposição. Anteriormente a deliberação que afastava o regime do pagamento de quotas pela permilagem só podia ser alterado por 2/3 sem oposição. 
  1. Obrigatoriedade de reposição do Fundo Comum de Reserva. Os prédios que deliberem a utilização do Fundo Comum de Reserva para outros fins passam a estar obrigados à sua reposição no prazo de 12 meses através de quotização extra. 
  1. Na reparação do terraços de cobertura o pagamento das reparações é feito pela permilagem com exceção dos casos de má utilização. Este regime consiste na adoção da prática jurisprudencial dominante. 

Pode uma deliberação da Assembleia de Condóminos ser anulada nos Julgados de Paz?

O valor da causa é fixado nos Julgados de Paz nos precisos termos do Código de Processo Civil aplicável por remissão do artigo 63º da Lei dos Julgados de Paz. Dispõe o art.º 296 nº 1 do Código de Processo Civil que “a toda causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”.

Resulta do citado preceito que a “utilidade económica” imediata do pedido, expressa em dinheiro, constitui o critério geral para a determinação do valor da causa (Lebre de Freitas in “Código de Processo Civil anotado, vol. I, pág. 543 escreve que há, porém, que ter em conta que o pedido se funda sempre na causa de pedir, que o explica e o delimita. Dela – conclui aquele Mestre – não abstrai o critério da utilidade económica imediata do pedido, pelo que este não é considerado abstratamente, mas sim em confronto com a causa de pedir, para apuramento do valor da causa…Tal como o pedido desligado da causa de pedir não basta à determinação do valor da ação, também a causa de pedir, por si, não o determina…”(sublinhado nosso) 

Por sua vez, preceitua o artigo 301º do Código de Processo Civil que “quando a ação tiver por objeto a apreciação da existência, validade, cumprimento, modificação ou resolução de um ato jurídico, atender-se-á ao valor do ato determinado pelo preço ou estipulado pelas partes”.  

E por último, o artigo 303º do Código de Processo Civil estabelece que “as ações sobre o estado das pessoas ou sobre interesses imateriais consideram-se sempre de valor equivalente à alçada da Relação e mais € 0,01” 

Ora, caso a deliberação a anular tenha como base a validade da deliberação (por exemplo deliberação estranha à convocatória ou tomada com falta de quórum) ou um interesse não quantificável não nos parece possível fazer intervir o Julgado de Paz.

Na verdade, as ações sobre interesses imateriais compreendem as ações cujo objeto não tem expressão pecuniária, as ações cujo benefício não pode traduzir-se em dinheiro (ALBERTO DOS REIS, «Código de Processo Civil Anotado, I, 3.ª edição, pág. 414»). 

Encontramos na nossa jurisprudência unanimidade em considerar que “numa ação em que é pedida a anulação de todas as deliberações tomadas na Assembleia de Condóminos, onde, entre outras, estão em causa questões inerentes à validade da sua convocatória, terá de se entender, para efeitos de atribuição do valor à ação, estarmos face a situação que visa a salvaguarda de valores imateriais, correspondendo-lhe, por isso, o valor de 30.000,01€. (V. Acórdão da Relação de Lisboa 20-09-2013). 

A resposta em princípio é afirmativa. A matéria enquadra-se no diploma dos Julgados de Paz. Mas atenção ao conteúdo da deliberação que pode exceder o valor da competência que lhes é atribuída. Vejamos.

O valor da causa é fixado nos Julgados de Paz nos precisos termos do Código de Processo Civil aplicável por remissão do artigo 63º da Lei dos Julgados de Paz. Dispõe o art.º 296 nº 1 do Código de Processo Civil que “a toda causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”.

Resulta do citado preceito que a “utilidade económica” imediata do pedido, expressa em dinheiro, constitui o critério geral para a determinação do valor da causa (Lebre de Freitas in “Código de Processo Civil anotado, vol. I, pág. 543 escreve que há, porém, que ter em conta que o pedido se funda sempre na causa de pedir, que o explica e o delimita. Dela – conclui aquele Mestre – não abstrai o critério da utilidade económica imediata do pedido, pelo que este não é considerado abstratamente, mas sim em confronto com a causa de pedir, para apuramento do valor da causa…Tal como o pedido desligado da causa de pedir não basta à determinação do valor da ação, também a causa de pedir, por si, não o determina…”(sublinhado nosso) 

Por sua vez, preceitua o artigo 301º do Código de Processo Civil que “quando a ação tiver por objeto a apreciação da existência, validade, cumprimento, modificação ou resolução de um ato jurídico, atender-se-á ao valor do ato determinado pelo preço ou estipulado pelas partes”.  

E por último, o artigo 303º do Código de Processo Civil estabelece que “as ações sobre o estado das pessoas ou sobre interesses imateriais consideram-se sempre de valor equivalente à alçada da Relação e mais € 0,01” 

Ora, caso a deliberação a anular tenha como base a validade da deliberação (por exemplo deliberação estranha à convocatória ou tomada com falta de quórum) ou um interesse não quantificável não nos parece possível fazer intervir o Julgado de Paz.

Na verdade, as ações sobre interesses imateriais compreendem as ações cujo objeto não tem expressão pecuniária, as ações cujo benefício não pode traduzir-se em dinheiro (ALBERTO DOS REIS, «Código de Processo Civil Anotado, I, 3.ª edição, pág. 414»). 

Encontramos na nossa jurisprudência unanimidade em considerar que “numa ação em que é pedida a anulação de todas as deliberações tomadas na Assembleia de Condóminos, onde, entre outras, estão em causa questões inerentes à validade da sua convocatória, terá de se entender, para efeitos de atribuição do valor à ação, estarmos face a situação que visa a salvaguarda de valores imateriais, correspondendo-lhe, por isso, o valor de 30.000,01€. (V. Acórdão da Relação de Lisboa 20-09-2013). 

Divisão de fração e alterações à linha arquitectónica do edifício

1. Maioria de aprovação

A aprovação de inovações/alteração da linha arquitetónica do edifício apenas necessita de uma aprovação por uma maioria de 2/3 do capital do prédio, ainda que possam existir votos contra, de acordo com o disposto no artigo 1422.º n.º 3 e no artigo 1425.º n.º 1, ambos do Código Civil e que passamos a transcrever. 

Artigo 1422.º n.º 3 do Código Civil – 3 – As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.” 

Artigo 1425.º n.º 1 do Código Civil – “Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio.” 

Pelo que, a existência de um voto contra não obsta à aprovação das inovações propostas e das obras que implicavam a alteração da linha arquitetónica do prédio. 

2. Divisão de uma fração autónoma

No que concerne à questão da divisão de uma fração autónoma, de acordo com o artigo 1422.º A do Código Civil n.º 3 “Não é permitida a divisão de fracções em novas fracções autónomas, salvo autorização do título constitutivo ou da assembleia de condóminos, aprovada sem qualquer oposição.” 

Contudo, existem exceções relacionadas com as chamadas obras de inovação.

O Tribunal da Relação de Lisboa refere no seu acórdão de 15/12/2011 que “I – Em matéria de “obras novas” realizadas pelos condóminos o legislador optou por não definir o que são obras “inovadoras” nem consagrar na lei o que deve entender-se por inovação. II – Deixando, e bem, esse papel para a jurisprudência, que deverá, caso a caso, enquadrar no referido conceito as obras que os condóminos realizarem e que, em face do caso concreto e das circunstâncias fácticas apuradas, possam ser consideradas como tal. III – Se atentarmos no próprio significado etimológico da expressão, concluímos que “inovar” é nada mais, nada menos, do que “criar”, “fazer algo de novo”, “trazer algo de novo” àquilo que está. Portanto, obras inovadoras serão aquelas que trazem algo de novo ao que está, algo de “criativo”, introduzindo uma “novidade”, ou seja, algo diferente daquilo que está. IV – Inovadoras serão também aquelas obras que alteram a edificação no seu estado original, modificando o seu estado primitivo. Com alterações que tanto podem ser de substância, como de forma, em modificações relativas ao seu destino ou afectação da fracção do imóvel ou das partes comuns do edifício.” 

3. A questão do prejuízo para as demais frações

No caso de divisão de uma fração podem ainda colocar-se questões sobre a existência de menos-valias com a eventual alteração do uso da fração autónoma.

Sucede porém, que a eventual alteração do uso da fração importará não só uma prévia aprovação por parte da Câmara Municipal, como também a alteração do título constitutivo da propriedade horizontal, levando à necessidade de uma nova deliberação por unanimidade dos condóminos nesse sentido. 

O carácter imperativo da norma do n.º 1 do artigo 1419.º do Código Civil implica a nulidade de qualquer alteração da finalidade a que se destinam as frações (artigo 294.º do Código Civil). 

Sendo que, o artigo 1422.º, n.º 2, alínea c), do Código Civil estabelece que fica vedado aos condóminos dar à sua fração uso diverso do fim a que é destinado. O atual ou futuro proprietário da fração autónoma tem a liberdade de gerir a sua propriedade, por qualquer forma, desde que, respeite o uso da fração e a legislação que regula a sua atividade, sendo que, a realização de obras que possam ou não levar ao suprimento da piscina interior terão de ser previamente autorizadas pela Câmara Municipal. 

4. A questão da revogação da deliberação de divisão da fracção.

Por último, poderão os condóminos colocar à discussão e votação uma eventual revogação ou modificação da deliberação tomada na assembleia que aprova a divisão da fração, ainda que salvaguardados eventuais direitos adquiridos,

Nessa medida, explana o Supremo Tribunal de Justiça no seu acórdão de 20 de Março de 2012 que “I – A deliberação validamente constituída numa assembleia de condóminos só deixa de vigorar se uma outra deliberação, validamente formada e adoptada, a vier a derrogar, modificar ou substituir por outra que lhe retire eficácia deliberativa. II – Uma deliberação vale e adquire eficácia para aqueles que nela intervieram e puderam, validamente, discutir a sua formação e constituição, como acto de vinculação externa e como regra de conduta interna. III – O condómino que pretenda afastar uma deliberação terá que, para o efeito, proceder de modo a provocar uma assembleia, convocada para o efeito e com ponto de discussão específico da problemática a derrogar, sob pena de a omissão deste procedimento obviar a que em assembleia convocada para a discussão e tratamento de outras matérias possa vir a ser formada uma deliberação que tenha como pressuposto a deliberação condicionante.” 

De igual modo, refere Sandra Passinhas, “A Assembleia de Condóminos e o Administrador da Propriedade Horizontal”, Almedina, 2.ª edição, 2002, pág. 246-247 onde se escreve que: “As deliberações da assembleia tomadas em sede de gestão do condomínio assumem carácter de decisões administrativas, não determinam um vínculo contratual permanente, e são sempre susceptíveis de revogação e de modificação, ainda que tomadas por unanimidade. A decisão da assembleia em sede de gestão é sempre contingente e transitória e não pode precludir novas e diversas deliberações que possam surgir no decurso da vida do condomínio. As novas deliberações, revogadoras ou modificativas precedentes, tomadas sobre o mesmo objecto, porque adoptadas no modo e com as formalidades legais, são perfeitamente válidas e eficazes para todos os condóminos. Isto ainda que a anterior deliberação haja sido tomada por unanimidade e a segunda por maioria mínima prescrita na lei, de acordo com o objecto da deliberação e o tipo de assembleia.”