Posso queixar-me de um vizinho ruidoso ao Condomínio?

O ruído é um problema transversal às relações de vizinhança, evidentemente potenciado nas situações de propriedade horizontal. 

Antes de mais, cumpre dizer que o ruído de vizinhança não é um problema do condomínio (embora na maioria das vezes surja no seu âmbito), mas sim das relações entre os condóminos. 

A situação deverá ser tratada diretamente pelos condóminos afetados pelo ruído. 

Posto isto, uma forma de lidar com a situação reportada, e que aconselhamos que seja o primeiro comportamento, é o envio de uma carta, a intimar os senhores proprietários da fração em causa a absterem-se de produzir ruído em níveis prejudiciais para os restantes condóminos, sob pena de não restar qualquer outra opção senão a via judicial. 

Este será o primeiro passo tendo em vista a resolução deste problema. 

No entanto, caso o envio de tal carta se mostre infrutífero, a lei prevê mecanismos judiciais próprios para defender os cidadãos que sejam prejudicados pela emissão de ruído pelos seus vizinhos. 

Desde já, sublinhe-se que os danos causados por este comportamento tornam possível o recurso a uma ação de responsabilidade civil extracontratual, na qual seria peticionada uma indemnização pelos prejuízos causados pela emissão de ruído, principalmente pela violação do direito ao descanso dos vizinhos. 

Porém, existe ainda outra via que, os condóminos afetados, poderão seguir: o recurso às autoridades policiais. 

Com efeito, indica o artigo 24.º do Decreto Lei 9/2007, no seu n.º 1 que “As autoridades policiais podem ordenar ao produtor de ruído de vizinhança, produzido entre as 23 e as 7 horas, a adoção das medidas adequadas para fazer cessar imediatamente a incomodidade” e no n.º 2 que “As autoridades policiais podem fixar ao produtor de ruído de vizinhança produzido entre as 7 e as 23 horas um prazo para fazer cessar a incomodidade”. 

Nesse sentido, caso após o envio da carta o ruído se mantenha sugerimos que, os vizinhos lesados, entrem em contacto com as autoridades competentes para que aos mesmos levantem o auto da ocorrência. 

De modo a aumentar a eficácia da queixa, devem os queixosos aproveitar todas as oportunidades para registar datas, horas e a duração do ruido, assim como para reunir testemunhas: os outros vizinhos; visitas; etc. 

Assim, no seguimento da notificação pelas autoridades policiais, caso os condóminos ruidosos perpetuem o comportamento visado, tal constituirá uma contraordenação ambiental, punível com uma coima de € 500 a €2500 em caso de negligência e de €1500 a € 5000 em caso de dolo. 

13 Breves notas sobre o novo regime da Propriedade Horizontal

Foi aprovado na recentemente na Assembleia da República o novo regime da propriedade horizontal que introduz um conjunto de alterações muito significativas na forma de relacionamento entre condóminos e com a administração. Deixamos aqui nota das principais alterações de acordo com o nosso subjetivo grau de importância, remetendo para estudo mais detalhado de cada uma no futuro mais próximo da entrada em vigor dentro de aproximadamente 3 meses. 

  1. Venda do imóvel e responsabilidade pelas quotas de condomínio. O condomínio que pretenda vender o imóvel necessita solicitar ao Administrador declaração escrita com as dividas ao condomínio. O administrador entrega ao vendedor uma relação das quotas de condomínio em dívida no prazo máximo de 10 dias a contar do pedido formulado. A falta do pedido de declaração implica que o vendedor assume a responsabilidade pelas dívidas. Caso o comprador declare na escritura que prescinde da declaração de dívida assume enquanto novo proprietário a dívida. As quotas extra que se vençam até à data da escritura são da responsabilidade do anterior proprietário e as quotas extra que se vençam após a escritura são da responsabilidade do novo proprietário. 
  1. Prazo para execução de deliberações. O administrador passa a dispor de um prazo máximo de 15 dias uteis para executar as deliberações da Assembleia (salvo casos de impossibilidade devidamente fundamentada). 
  1. Convocação da Assembleia de Condóminos por email. Passa a ser possível convocar a Assembleia de Condóminos por email para os condóminos que o declarem. O mesmo é valido para o envio da ata das deliberações. 
  1. Reunião em 2ª convocatória 30 minutos após no caso de inexistência de quórum. Passa a ser consagrado o entendimento já em vigor na generalidade dos prédios por razões prática abandonando-se o anterior texto da lei que obrigava à repetição uma semana após. 
  1. Realização de Assembleias à distância. Manutenção do regime em vigor durante a pandemia para futuro com a salvaguarda por parte das administrações dos condóminos que não disponham dos meios tecnológicos adequados. 
  1. Prazo para interposição da ação executiva. A ação judicial passa a ser instaurada no prazo máximo de 90 dias a contar do primeiro incumprimento do condómino, salvo deliberação contrária da Assembleia no caso de pequenas dívidas inferiores ao valor do IAS (atualmente 438,81).  
  1. Deveres de informação aos condóminos quanto a processos judiciais. Passa a ser obrigatória para os administradores a informação aos condóminos de qualquer ação movida contra o condomínio e semestralmente do andamento dos processos em curso. 
  1. O administrador do condomínio passa a representar a universalidade dos condóminos em processo judicial. Inclui-se nesta representação as deliberação da Assembleia contrariando o entendimento maioritário dos Tribunais que consideravam até agora ser necessário o chamamento de todos os condóminos. 
  1. Obrigatoriedade de apresentação em Assembleia de 3 orçamentos para a realização de obras. 
  1. Alterações ao titulo constitutivo podem ser supridas judicialmente sempre que a oposição seja inferior a 1/10 do valor do capital investido. Na prática um condómino isolado deixa de poder inviabilizar as alterações ao título podendo o Tribunal vir a decidir pela alteração do titulo quando menos de 1/10 de todos os condóminos a aprove e a alteração não modifique as condições de uso, o valor relativo ou fim a que as frações se destinam. 
  1. A alteração da forma de repartição das quotas passa a ser aprovada por maioria do valor total do prédio sem oposição. Anteriormente a deliberação que afastava o regime do pagamento de quotas pela permilagem só podia ser alterado por 2/3 sem oposição. 
  1. Obrigatoriedade de reposição do Fundo Comum de Reserva. Os prédios que deliberem a utilização do Fundo Comum de Reserva para outros fins passam a estar obrigados à sua reposição no prazo de 12 meses através de quotização extra. 
  1. Na reparação do terraços de cobertura o pagamento das reparações é feito pela permilagem com exceção dos casos de má utilização. Este regime consiste na adoção da prática jurisprudencial dominante. 

Divisão de fração e alterações à linha arquitectónica do edifício

1. Maioria de aprovação

A aprovação de inovações/alteração da linha arquitetónica do edifício apenas necessita de uma aprovação por uma maioria de 2/3 do capital do prédio, ainda que possam existir votos contra, de acordo com o disposto no artigo 1422.º n.º 3 e no artigo 1425.º n.º 1, ambos do Código Civil e que passamos a transcrever. 

Artigo 1422.º n.º 3 do Código Civil – 3 – As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.” 

Artigo 1425.º n.º 1 do Código Civil – “Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio.” 

Pelo que, a existência de um voto contra não obsta à aprovação das inovações propostas e das obras que implicavam a alteração da linha arquitetónica do prédio. 

2. Divisão de uma fração autónoma

No que concerne à questão da divisão de uma fração autónoma, de acordo com o artigo 1422.º A do Código Civil n.º 3 “Não é permitida a divisão de fracções em novas fracções autónomas, salvo autorização do título constitutivo ou da assembleia de condóminos, aprovada sem qualquer oposição.” 

Contudo, existem exceções relacionadas com as chamadas obras de inovação.

O Tribunal da Relação de Lisboa refere no seu acórdão de 15/12/2011 que “I – Em matéria de “obras novas” realizadas pelos condóminos o legislador optou por não definir o que são obras “inovadoras” nem consagrar na lei o que deve entender-se por inovação. II – Deixando, e bem, esse papel para a jurisprudência, que deverá, caso a caso, enquadrar no referido conceito as obras que os condóminos realizarem e que, em face do caso concreto e das circunstâncias fácticas apuradas, possam ser consideradas como tal. III – Se atentarmos no próprio significado etimológico da expressão, concluímos que “inovar” é nada mais, nada menos, do que “criar”, “fazer algo de novo”, “trazer algo de novo” àquilo que está. Portanto, obras inovadoras serão aquelas que trazem algo de novo ao que está, algo de “criativo”, introduzindo uma “novidade”, ou seja, algo diferente daquilo que está. IV – Inovadoras serão também aquelas obras que alteram a edificação no seu estado original, modificando o seu estado primitivo. Com alterações que tanto podem ser de substância, como de forma, em modificações relativas ao seu destino ou afectação da fracção do imóvel ou das partes comuns do edifício.” 

3. A questão do prejuízo para as demais frações

No caso de divisão de uma fração podem ainda colocar-se questões sobre a existência de menos-valias com a eventual alteração do uso da fração autónoma.

Sucede porém, que a eventual alteração do uso da fração importará não só uma prévia aprovação por parte da Câmara Municipal, como também a alteração do título constitutivo da propriedade horizontal, levando à necessidade de uma nova deliberação por unanimidade dos condóminos nesse sentido. 

O carácter imperativo da norma do n.º 1 do artigo 1419.º do Código Civil implica a nulidade de qualquer alteração da finalidade a que se destinam as frações (artigo 294.º do Código Civil). 

Sendo que, o artigo 1422.º, n.º 2, alínea c), do Código Civil estabelece que fica vedado aos condóminos dar à sua fração uso diverso do fim a que é destinado. O atual ou futuro proprietário da fração autónoma tem a liberdade de gerir a sua propriedade, por qualquer forma, desde que, respeite o uso da fração e a legislação que regula a sua atividade, sendo que, a realização de obras que possam ou não levar ao suprimento da piscina interior terão de ser previamente autorizadas pela Câmara Municipal. 

4. A questão da revogação da deliberação de divisão da fracção.

Por último, poderão os condóminos colocar à discussão e votação uma eventual revogação ou modificação da deliberação tomada na assembleia que aprova a divisão da fração, ainda que salvaguardados eventuais direitos adquiridos,

Nessa medida, explana o Supremo Tribunal de Justiça no seu acórdão de 20 de Março de 2012 que “I – A deliberação validamente constituída numa assembleia de condóminos só deixa de vigorar se uma outra deliberação, validamente formada e adoptada, a vier a derrogar, modificar ou substituir por outra que lhe retire eficácia deliberativa. II – Uma deliberação vale e adquire eficácia para aqueles que nela intervieram e puderam, validamente, discutir a sua formação e constituição, como acto de vinculação externa e como regra de conduta interna. III – O condómino que pretenda afastar uma deliberação terá que, para o efeito, proceder de modo a provocar uma assembleia, convocada para o efeito e com ponto de discussão específico da problemática a derrogar, sob pena de a omissão deste procedimento obviar a que em assembleia convocada para a discussão e tratamento de outras matérias possa vir a ser formada uma deliberação que tenha como pressuposto a deliberação condicionante.” 

De igual modo, refere Sandra Passinhas, “A Assembleia de Condóminos e o Administrador da Propriedade Horizontal”, Almedina, 2.ª edição, 2002, pág. 246-247 onde se escreve que: “As deliberações da assembleia tomadas em sede de gestão do condomínio assumem carácter de decisões administrativas, não determinam um vínculo contratual permanente, e são sempre susceptíveis de revogação e de modificação, ainda que tomadas por unanimidade. A decisão da assembleia em sede de gestão é sempre contingente e transitória e não pode precludir novas e diversas deliberações que possam surgir no decurso da vida do condomínio. As novas deliberações, revogadoras ou modificativas precedentes, tomadas sobre o mesmo objecto, porque adoptadas no modo e com as formalidades legais, são perfeitamente válidas e eficazes para todos os condóminos. Isto ainda que a anterior deliberação haja sido tomada por unanimidade e a segunda por maioria mínima prescrita na lei, de acordo com o objecto da deliberação e o tipo de assembleia.” 

Arrendamento de arrumos

CONTEXTUALIZAÇÃO: 

O presente artigo baseia-se num parecer que nos foi solicitado acerca da possibilidade de um condomínio arrendar os arrumos a quem o pretenda, cabe saber se estes podem ser arrendados a terceiros, aos condóminos do prédio, ou a ambos.  

ANÁLISE:  

Antes de qualquer consideração de maior, importa realçar que o prédio em causa está constituído em propriedade horizontal, cujo regime legal está previsto nos artigos 1414.º e seguintes do Código Civil (doravante CC).   

Com efeito, de acordo com o artigo 1414.º, “As frações de que um edifício se compõe, em condições de constituírem unidades independentes, podem pertencer a proprietários diversos em regime de propriedade horizontal”, de modo que apenas podem ser objeto deste tipo de propriedade as frações autónomas que constituam unidades independentes, distintas e isoladas entre si, e dotadas de saída própria para uma parte comum do prédio ou para a via pública, vide artigo 1415.º do refiro diploma legal.   

Ora, estando um prédio constituído em propriedade horizontal, os seus moradores são considerados condóminos do mesmo, ficando, por isso, legalmente instituídos num conjunto de direitos e deveres.   

Para o que ora interessa, e no âmbito dos direitos dos condóminos, o artigo 1420.º, n.º 1 do CC dispõe que: “Cada condómino é proprietário exclusivo da fração que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício”. Razão pela qual importa, em primeiro lugar, apurar quais as partes comuns de um edifício constituído em propriedade horizontal, maxime, e atendendo ao cerne da questão subjudice, se os arrumos constituem, ou não, parte comum. 

Possibilidade de ser arrendado a condóminos: 

Nesta possibilidade é de referir que, as partes comuns estão na qualidade de compropriedade, o que significa que todos os condóminos são proprietários em comum dessas partes, nos termos do art.1403º , nº1 do CC, tendo o direito de uso, administração e disposição da coisa comum.  

Assim, não haverá necessidade de arrendar os arrumos aos condóminos, uma vez que estes podem dispor deles quando assim o entendam, nos termos do art.1408º nº1 do CC.  

Possibilidade de ser arrendado a terceiros:  

Quanto a esta possibilidade é de referir que, de acordo com o artigo 1421.º, n.º 2 do CC, “São comuns as seguintes partes do edifício: e) Em geral, as coisas que não sejam afetadas ao uso exclusivo de um dos condóminos”.  

Pelo que, cabe saber se os arrumos se inserem nesta alínea e se podem ser consideramos como parte comum. Assim sendo, é de aferir se os arrumos são de uso exclusivo de um dos condóminos, ou seja, se um dos condóminos utiliza os arrumos para uso próprio, se assim o for, esta presunção, existente no art.1421º nº2 al. e), é ilidida.  

Assim, segundo o nº2 do art.1421º do CC, trata-se de uma presunção ilidível, ou seja, pode ser afastada se indícios resultarem que essa parte é afeta a uso exclusivo de um dos condóminos, segundo o nº3 do art.1421º do CC.  

Nestes termos, se os arrumos não se encontrarem afetos ao uso exclusivo de um dos condóminos, segundo o nº3 do art.1421º nº3 do CC, é considerado parte comum, e assim sendo, é necessário o consentimento dos outros condóminos comproprietários, para arrendar os referidos arrumos, nos termos do art.1430º nº1 do CC, “A administração das partes comuns do edifício compete à assembleia de condóminos e a um administrador”.  

Face ao exposto, é necessário consultar o título constitutivo, no sentido de saber se este dispõe neste sentido. De seguida, é necessário consultar os restantes condóminos, em assembleia de condóminos de forma a deliberar sobre o assunto. Sendo que, as pessoas coletivas ou singulares que venham a arrendar estes arrumos estão sujeitas aos deveres e limites impostos aos condóminos, nos termos do art.1422º nº1 e nº2, e art.1424º do CC.  

Ainda é de referir, que o arrendamento de uma parte comum do prédio não retira a qualidade de comproprietário aos restantes condóminos, sendo que é um “direito incindível”, ou seja, não se pode alienar, nos termos do art.1420º nº1 do CC. 

No entanto, assiste ao comproprietário o direito de dispor da sua quota parte, nos termos do art.1408º nº1, “O comproprietário pode dispor de toda a sua quota na comunhão ou de parte dela, mas não pode, sem consentimento dos restantes consortes, alienar ou onerar parte específica da coisa comum”, uma vez que, os condóminos comproprietários das partes comuns tem os seus direitos e deveres regulados pelo Capítulo V do CC.   

Face ao exposto, é de referir que as partes comuns do prédio estão sujeitas ao regime de compropriedade, e por isso cada comproprietário pode livremente dispor da sua quota parte. No entanto, é de salientar que é necessário analisar o título constitutivo, que pode dispor em sentido contrário quanto à qualidade dos arrumos, uma vez que se presume parte comum, no entanto esta presunção é ilidível, nos termos do nº2 do art.1421º nº2, ou seja, pode ser afastada com prova em contrário.  

O destino a dar aos arrumos deve ser discutido em Assembleia de condóminos, no sentido de todos os condóminos deliberarem sobre a possibilidade de arrendar a parte comum, e conferir se esta não está afeta a uso exclusivo de algum dos condóminos. Deste modo, podem os condóminos dispor dessa parte comum, no entanto, o locatário está sujeito às limitações impostas pelo art.1422º, nomeadamente o nº2 “É especialmente vedado aos condóminos, al c): Dar-lhes uso diverso do fim a que é destinada”. Portanto, sendo arrumos tem de ser afeto a essa finalidade. Sendo que lhe incumbe também atos de conservação e fruição, segundo o art.1424º nº1.  

Assim, o contrato de arrendamento é celebrado nos termos do art.1022º e seguintes, sendo que nos termos do art.1024º nº1 do CC, “A locação constitui, para o locador, um ato de administração ordinária, exceto quando for celebrada por prazo superior a seis anos”. No seguimento do já referido, à Assembleia de condóminos compete deliberar atos de administração de partes comuns, nos termos do art.1430º nº1 do CC.  

Neste sentido, AC TRL de 03-07-2003, Proc. nº4853/2003-6: “De acordo com o nº 2 do art. 1024º do CC, o arrendamento de prédio indiviso feito pelo consorte ou consortes administradores só se considera válido quando os restantes proprietários manifestem, antes ou depois do contrato, o seu assentimento”. 

Isto significa que o contrato de arrendamento de uma parte comum de um prédio em propriedade horizontal só é válido se todos os condóminos estiverem de acordo, caso contrário o mesmo será nulo. 

Concluindo, no seguimento do supra referido, cumprindo certos requisitos e formalidades é possível arrendar parte comum a terceiros, no entanto é sempre necessário o consentimento dos condóminos para esse efeito, uma vez que a parte comum, neste caso os arrumos, está na qualidade de compropriedade de cada um dos condóminos e a sua utilização sem o seu consentimento é posse de coisa alheia.  

Quanto à possibilidade de arrendamento aos condóminos, este não é a nosso ver possível, uma vez que os condóminos têm já direito a dispor de partes comuns do prédio.  

Existe preferência do Condomínio na aquisição de uma loja do prédio?

Os direitos/obrigações legais de preferência jogam, em geral, entre titulares de direitos reais: art. 1380.° (terrenos confinantes), art. 1535.° (direito de superfície), art.º 1555.° (servidões legais), art. 1499.° c) e 1501.° d) (antes de ser abolida a enfiteuse pelo Dec.-Lei n.° 195-A/76, de 16.3, e Dec-Lei n.° 233/76, de 2.4).  E até às vezes tais direitos/obrigações inserem-se no âmbito da mesma relação jurídica: art.º 1409.º e 1410.º (compropriedade). 

Os arrendatários de prédios urbanos ou de fracções autónomas dos mesmos têm direito de preferência na sua venda ou dação em cumprimento (art. 47.° a 49.° do RAU).  

Determinadas pessoas que viviam com o arrendatário de habitação, quando o arrendamento caduque pela respectiva morte, têm direito de preferência, desde que se verifiquem determinadas condições, na compra do local arrendado (art. 97.° do RAU). 

Os co-herdeiros gozam de direito de preferência na venda ou dação em cumprimento dos quinhões hereditários (art. 2130.°).  

O senhorio tem direito de preferência no “trespasse por venda ou dação em cumprimento” do estabelecimento comercial existente no prédio arrendado (art. 116.° do RAU).  

Na venda ou na adjudicação judicial de quotas têm preferência em primeiro lugar os sócios e, depois, a sociedade ou uma pessoa por esta designada (art. 239.º, 5 do Cód. Soc. Com.). 

No âmbito da propriedade horizontal, os proprietários de cada fração autónoma são apenas comproprietários das partes comuns do edifício. 

Porém, dispõe o artigo 1423.º do Código Civil que “Os condóminos não gozam do direito de preferência na alienação de frações nem do direito de pedir a divisão das partes comuns.” 

O condomínio enquanto entidade equiparada a pessoa coletiva não possui qualquer direito de preferência sobre a alienação de uma fração autónoma, nem tão pouco os restantes proprietários do prédio, de acordo com o artigo 1423.º do Código Civil. 

A propriedade horizontal vem prevista e regulada nos art.º 1414.º ss. do C.Civil, que estabelece como princípio geral: “As fracções de que um edifício se compõe, em condições de constituírem unidades independentes, podem pertencer a proprietários diversos em regime de propriedade horizontal.” 

O art.º 1420.º n.º 1 diz-nos que cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício, enunciando o art.º 1421.º no seu n.º 1 quais sãos as partes comuns do edifício constituído em regime de propriedade horizontal e acrescentado o n.º 2 aquelas que se presumem comuns. 

A respeito dos direitos subjacentes à propriedade horizontal, diz-nos de forma impressiva Gonçalo de Oliveira Guimarães, in. A personalidade judiciária do Condomínio e a sua representação em juízo, Revista Julgar n.º 23, pág. 60: “O núcleo do instituto da propriedade horizontal é constituído por direitos privativos de domínio, a que estão associados, com função instrumental, mas de modo incindível e perene, direitos de compropriedade sobre as partes do prédio não abrangidas por uma relação exclusiva. Foi para distinguir as situações de propriedade horizontal das de simples contitularidade ou comunhão sobre coisa indivisa que o legislador recorreu ao conceito de condomínio, acolhendo as teorias de PLANIOL, RIPERT E BAUDRY-LACANTINERIE.  

O condomínio é, assim, no dizer de HENRIQUE MESQUITA, a figura definidora da situação em que uma coisa materialmente indivisa ou com estrutura unitária pertence a vários contitulares, mas tendo cada um deles direitos privativos ou exclusivos de natureza dominial sobre frações determinadas. No fundo, o direito de propriedade sobre a parte exclusiva é combinado com o direito de compropriedade sobre as partes comuns. Daí nasce um direito real complexo, no sentido de que combina figuras preexistentes de direitos reais. É, no entanto, diferente do mero somatório dos esquemas da propriedade e da compropriedade; contendo o uma regulamentação própria do seu exercício, constitui a se um direito real. 

Na propriedade horizontal cada um dos condóminos vê integrar-se na sua esfera jurídica um direito real específico e próprio que conjuga dois direitos reais coexistentes: um direito de propriedade exclusivo sobre a fração de que cada um é titular e um direito de compropriedade sobre as partes comuns do edifício constituído em propriedade horizontal. 

A posição maioritária da jurisprudência portuguesa – que não subscrevemos integralmente – tem sido de que o Condomínio não possui personalidade jurídica, razão pela qual, não poderá ser titular de direitos, nomeadamente, o direito de propriedade. 

Sendo que, alguns autores defendem que o condomínio pode peticionar o direito de propriedade em representação dos titulares das frações autónomas, isto é, sempre será admissível que o condomínio adquira nova propriedade para ser incorporada à propriedade já existente, tanto através da aquisição originária pela construção de áreas novas, como pela aquisição negocial de novos bens (não será por acaso que o Código Civil fala em “obras de inovação”, que preveja a aprovação de um orçamento do condomínio, ou que o Estado atribua um número de contribuinte ao Condomínio constituindo-o como sujeito passivo na liquidação de impostos, designadamente de IVA).  

Pois, o facto de não ter personalidade jurídica não afasta o condomínio de ser titular de direitos e obrigações, de natureza patrimonial. 

Em face da inexistência de unanimidade quanto a esta questão e até algumas contradições da legislação, veja-se, a possibilidade de deliberação por parte do condomínio na venda da casa da porteira, transformando uma parte comum numa fração autónoma; inclinamo-nos para que seja vedado quer ao condomínio, quer aos condomínios individualmente o direito de preferência na alienação de uma outra fracção, por exemplo uma loja.

O que fazer quando a sua permilagem foi mal calculada

As permilagens das frações são definidas na escritura de constituição da propriedade horizontal e em caso de ser detetado algum erro poderão ser retificadas nos seguintes termos:  

Estabelece o artigo 1418º do Código Civil que é o título constitutivo da propriedade horizontal que especifica as partes do edifício que correspondem às várias frações, por forma a que sejam individualizadas e no qual é fixado o valor relativo de cada fração, expresso em permilagem, do valor total do prédio.  

Ora, a fixação destes valores é efetuada livremente pelo construtor ou instituidor da propriedade horizontal e podem reportar-se aos mais diversos critérios, nomeadamente, “custo/m2, qualidade da construção, área das frações, afetação ou fim, preço de venda, rendimento, localização, exposição ao sol, a vista panorâmica” (in Abílio NetoManual da Propriedade Horizontal”, 4ª edição – reformulada, março 2015, Ediforum), entre outros, não se encontrando assim vinculados à observância de quaisquer regras nesta definição.  

O único imperativo existente é o de que, o valor do prédio tem de corresponder ao somatório do valor relativo de cada fração.  

Em anotação ao artigo 1418º do Código Civil o autor Abílio Neto (“Código Civil Anotado”, 19ª edição reelaborada, janeiro 2016, Ediforum) refere que, sendo o título constitutivo de propriedade horizontal notificável por escritura pública, podem os seus termos ser modificados por acordo de todos os Condóminos.  

Quer isto significar que as permilagens podem ser retificadas com aprovação de todos os Condóminos do prédio, em Assembleia de Condomínio, tal como dispõe o artigo 1419º do Código Civil.  

Quanto a esta questão importa ainda referir que mesmo nos casos em que, por exemplo, os valores sejam fixados sem correspondência às dimensões das frações, esta situação só poderá ser alterada mediante acordo unânime dos Condóminos, sem que seja possível obter o suprimento do consentimento de qualquer um dos Condóminos através dos meios judicias.  

Sendo este também o entendimento do Tribunal da Relação do Porto no seu Acórdão de 06/04/2017 (processo nº 1318/15.3T8PVZ.P1) quando dispõe que “I - A modificação do valor relativo de várias frações em relação ao valor total do prédio, expresso em permilagem, por consubstanciar alteração do título constitutivo da propriedade horizontal só se pode efetuar com o acordo de todos os condóminos através de escritura pública ou documento particular autenticado. II – Por conseguinte, não é legalmente admissível que essa modificação se concretize através de decisão judicial, nem sequer mediante o recurso a uma ação de suprimento do consentimento”.  

Ainda nos termos do artigo 1419º do Código Civil, a alteração ao título constitutivo, depois de devidamente aprovado por todos os Condóminos, pode ser efetuado através de escritura pública ou por documento particular autenticado.  

O Administrador pode, em representação do Condomínio, outorgar a escritura ou elaborar e subscrever o documento particular em causa, desde que munido de ata assinada por todos os Condóminos ondem expressem o seu acordo.  

Para a modificação do título constitutivo do prédio, são necessários os seguintes documentos:  

  1. Certidão do teor da descrição predial e das inscrições em vigor, passada pela conservatória do registo predial com antecedência não superior a seis meses ou, quanto a prédios situados em concelho onde tenha vigorado o registo obrigatório, a respetiva caderneta predial, atualizada; 
  2. Caderneta predial atualizada ou certidão do teor da inscrição matricial passada com antecedência não superior a um ano (A DGCI disponibilizou a possibilidade de obtenção via Internet da caderneta predial de prédios urbanos inscritos nas matrizes prediais, no seu site www.e-financas.gov.pt);  
  3. No caso de prédio omisso, o duplicado da participação para a inscrição na matriz, que tenha aposto o recibo da repartição de finanças, com antecedência não superior a um ano, ou outro documento dela emanado, autenticado com o respectivo selo branco;  
  4. Documento camarário comprovativo de que a alteração está de acordo com os correspondentes requisitos legais, ou, caso a modificação exija obras de adaptação, projeto devidamente aprovado;  
  5. Caso intervenha o administrador em representação do condomínio, ata assinada por todos os condóminos, da qual conste o respetivo acordo;  
  6. Em caso de divisão de frações autónomas não autorizada no título constitutivo, autorização da assembleia de condóminos, aprovada sem qualquer oposição; 
  7. As frações autónomas já existentes que ainda tenham crédito à habitação terão de solicitar autorização prévia do seu banco para a alteração da propriedade horizontal, uma vez que, com a transformação serão alteradas todas as permilagens do prédio; 
  8. Será necessário proceder ao preenchimento e entrega de Modelo 1 do IMI com as alterações que as frações do prédio vão sofrer; 

O valor da escritura será proporcional ao número global de frações, ao qual acrescerá o valor dos registos na conservatória competente, não podendo com isso saber exatamente quais os valores envolvidos.

É possível afixar a lista dos devedores do condomínio?

É prática usual das Administrações de Condomínios, quer sejam administradores internos, quer se tratem de empresas que exercem a atividade de gerir e administrar os condomínio, de afixar no Hall de Entrada do Edifício uma listagem na qual consta quais as frações que se encontrem em dívida para o condomínio, pelo não pagamento das quotas de condomínio que se encontrem já vencidas.   

Não obstante se tratar de uma prática regularmente utilizada, existe uma questão bastante pertinente que se deve ter em linha de conta, nomeadamente a de saber até que ponto a afixação da listagem em causa viola o direito à proteção dos dados pessoais dos condóminos.   

Ora, a Comissão Nacional de Dados já se pronunciou sobre o assunto acima explanado, tendo esclarecido que ‘’ O conceito de tratamento que nos é dado pelo artigo 3.º alínea b) da Lei 67/98 é amplo e nele se englobam as operações sobre dados pessoais efectuadas, com ou sem meios automatizados, tais como “a recolha, registo, a organização…a comunicação por transmissão, por difusão ou por qualquer outra forma de colocação à disposição”.  

Quer haja a divulgação do nome ou, tão só, da fração, estamos perante dados pessoais na medida em que – à luz do artigo 3.º al. a) da Lei 67/98 – integra-se no conceito de dados pessoais «qualquer informação…relativa a pessoa identificada ou identificável». Será «identificável» a pessoa que possa ser identificada. Ora, através da identificação da fração é facilmente identificável o respetivo proprietário, ainda que tenha que se recorrer à informação constante do registo predial (a qual é facilmente acessível).  

Encontrando-se a informação estruturada numa listagem (cf. artigo 3.º al. c) da Lei 67/98) e por aplicação das disposições precedentes, estamos perante um tratamento ao qual é aplicável a Lei 67/98.  Não há dúvida que a informação tratada é necessária, adequada e não excessiva à finalidade da administração e gestão da actividade do condomínio (cf. artigo 5.º n.º 1 al. c) da Lei 67/98, de 26 de Outubro). A grande dúvida que se coloca é a de saber se é legítimo o tratamento – na vertente de «divulgação» ou «difusão» – das quotas dos condóminos.’’ (Deliberação n.º 49/2014).  

É entendimento da Comissão Nacional de Proteção de Dados que a afixação no Hall de Entrada consubstancia uma situação violadora do direito à proteção dos dados pessoais do condómino, porquanto o Hall de Entrada não é um local privado e é possível identificar quem é o devedor apenas pela identificação da Fração que tem dívida para com o condomínio.  

Ademais, tem vindo a ser considerado como sendo um dado pessoal, ao abrigo do disposto no artigo 3.º da Lei 67/98, de 26 de outubro, pelo facto de se tratar de um dado pessoal da pessoa que é identificável, nomeadamente pela possibilidade de ser referida qual a fração que tem uma dívida para com o condomínio, sendo possível, portanto identificar qual a pessoa que tem a dívida.   

É possível verificar pelo acima exposto que, ainda que não se inclua na listagem de dívidas do condomínio o nome completo do proprietário, identificando-se apenas a fração em causa, tal constitui uma violação dos princípios de proteção de dados pessoais, consagrados na Lei 67/98 de 26 de outubro.   

Porém, ainda que tal seja o entendimento da Comissão Nacional de Proteção de Dados, existe jurisprudência que tem a sua determinação fixada no sentido oposto, no sentido de fixar que a afixação da listagem de devedores no Hall de Entrada não consubstancia qualquer prática ilícita, nem poderá ser facto suscetível de ser considerado como um crime de Difamação (Processo N.º 405/05.0GAVGS.C1do Tribunal da RELAÇÃO DE Coimbra), pelo facto de não ser intenção da Administração prejudicar os condóminos, mas sim, reaver os valores que se encontram em dívida.    

Face ao acima exposto, concluímos, no nosso entendimento, que, não obstante já ter existido jurisprudência que fixasse que a afixação da listagem de devedores não consubstancia qualquer crime de difamação, poderá existir um risco para a Administração que o faça, porquanto poderá considerar-se a violação da proteção de dados.  

Pelo que pode ser prestada a informação de quais os condóminos que são devedores, quer em Assembleia de Condóminos quer quando seja solicitado por algum condómino.   

Impugnação de deliberações vs correção da ata do Condomínio

Genericamente podemos assumir que impugnar uma decisão tomada em assembleia é um direito que todos os condóminos – que a não tenham aprovado – têm desde que a mesma seja contrária à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados.

A disposição relevante do Código Civil é a seguinte:

Artigo 1433.º

(Impugnação das deliberações)

1. As deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado.

2 – No prazo de 10 dias contado da deliberação, para os condóminos presentes, ou contado da sua comunicação, para os condóminos ausentes, pode ser exigida ao administrador a convocação de uma assembleia extraordinária, a ter lugar no prazo de 20 dias, para revogação das deliberações inválidas ou ineficazes.

3 – No prazo de 30 dias contado nos termos do número anterior, pode qualquer condómino sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem.

4 – O direito de propor a acção de anulação caduca no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária ou, caso esta não tenha sido solicitada, no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação.

5. Pode também ser requerida a suspensão das deliberações nos termos da lei de processo.

6. A representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as acções compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito.

Por outro lado, a ata pode conter erros, imprecisões ou omissões que importa igualmente corrigir.

A disposição relevante consta do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 268/1994, de 25 de Outubro.

A ata é o documento em que se relata por escrito ou em que se descreve e regista fielmente o que se passa em qualquer reunião, designadamente as deliberações tomadas nas assembleias dos condóminos.

Das disposições supra mencionadas resulta claramente uma distinção entre a impugnação das deliberações da Assembleia e uma mera correção de aspetos da ata que não correspondam ao que efetivamente tenha sido discutido.

No primeiro caso há lugar a impugnação da Assembleia e nova convocação da reunião. No segundo não, impondo-se a quem dirigiu os trabalhos aceitar ou rejeitar as sugestões de alteração, submetendo-as à próxima Assembleia ordinária.

A razão desta distinção é simples: enquanto que as deliberações podem afetar o condomínio e a esfera patrimonial dos condóminos justificando uma atuação imediata, os meros erros ou imprecisões não justificam uma intervenção imediata.